Ryan Bingham despede pessoas como profissão. O começo e o final do seu dia não são constantes. Os destinos, variáveis. Inerente a este estilo de vida, orgulhosamente proclamado, está a solidão e o distanciamento de qualquer pessoa ou bem. Tal realidade não tem uma causa, foi uma rotina adoptada, reiterada e consciente que se tornou único facto. Havendo patrões que não têm a coragem de despedir os seus trabalhadores, contratam quem os faça, e é aqui que entra em força Ryan Bingham que parece ser a pessoa mais adequada à tarefa.
Por vezes penso que me é difícil escrever sobre um filme, não sabendo por onde começar e onde terminar. Up In The Air - Nas Nuvens, garanto, é o filme que mais me custa a descrever, criticar (positiva ou negativamente) e por isso, a tomar uma posição. De antemão, qualquer pessoa de bom senso olha de lado ao próprio ponto de partida da história, mas se em alguns casos, essa realidade serve para expandir uma história, aqui não. Up In The Air é imoral. É com toda a probabilidade o filme mais imoral que vi nos últimos tempos; imoralidade essa não física, gráfica, chocante mas idealmente fria, distante e bruta.
A propaganda da empresa para a qual Ryan Bingham trabalha professa uma pseudo-moral de que um despedimento é a porta para novas oportunidades; moral essa que não é, pelo desenrolar da história, descartada, satirizada ou reprovada. As acções das duas principais personagens só os qualificam como iguais ou piores a essa mesma política de emprego. O distanciamento de tudo, acompanhado por uma rotatividade de gente com quem se cruzam no dia a dia, acaba por ser a mensagem última: a solidão não compensa. Pior, a razão pela qual as pessoas se casam, juntam e assim permanecem é a de se evitar a solidão a curto, médio e longo prazo.
Veja-se o filme de outro prisma: estrutural e linearmente, não é mais do que tantas outras histórias que se centram num "proscrito" por vontade própria, que acaba por mudar o seu estilo de vida e o seu egoísmo porque alguém melhor assim o convenceu. Há sempre o final arrependimento e abandono da vida que se criou e um regresso, ou tentativa pelo menos, à vida que se deixou escapar. O que aqui se destaca é que com o mesmo molde se conseguiu atrair um maior número de público, crítica e prémios pelos actores angariados, pelos diálogos escritos, e pelos planos filmados. Nesse aspecto gostei, e muito, de Up In The Air. Jason Reitman, representante anual do filme independente nas nomeações da Academia, mereceu, este ano, lá estar por ter conseguido a magnífica proeza de ter vendido uma moral involuntária ou voluntariamente (não sei qual é a pior) imoral de forma tão categórica.
Não me surpreende minimamente (acharia até estranho se não assim não fosse) que George Clooney e especialmente Vera Farmiga, estejam nomeados (não irão ganhar) por papéis aos quais trouxeram tanta profundidade. Aqui está uma prova de que não é preciso gritar, chorar, maquilhar ou trejeitar para se fazer um magnífico papel; é saber mostrar em expressões e meros diálogos o que se sente.
Se se entra em empatia, vai depender de cada um; há quem consiga e vá deixar-se seduzir pelos momentos cómicos em detrimento dos dramáticos ou não cómicos; outros, como eu, não conseguem. A mensagem e a premissa entram em conflito directo com os valores; valores esses que não abdicamos.
Honey and The Moon
quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010
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1 comentário:
vi este filme na neve e digo-te: muito muito bom
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